As regras de subcapitalização

A ideia a ser lançada com a presente exposição é fornecer um escopo geral sobre as regras de subcapitalização utilizadas no Brasil, bem como sua evolução histórica e a atual sistemática com o advento daInstrução Normativa RFB nº 1.154, de 12 de maio de 2011.

Primeiramente, faz-se necessário informar que o objetivo das regras de subcapitalização é evitar a diminuição de forma inconsistente da base tributária pelo excesso de endividamento e dedução de despesas de juros, por parte das pessoas jurídicas.

Tais regras estabelecem limites de endividamento como condição para a dedutibilidade, na apuração no Imposto de Renda de Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), dos juros pagos ou creditados por pessoas jurídicas brasileiras à:

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1) Pessoa física ou jurídica vinculada, ou;

2) Pessoa física ou jurídica residente em país/dependência com tributação favorecida ou submetida a regime fiscal diferenciado.

Importante lembrar que estas regras são adotadas em vários países membros da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), como exemplo podemos citar: EUA, Reino Unido, México, dentre outros.

As consequências trazidas por esta regulamentação são:

– Indedutibilidade das despesas de juros incidentes sobre o endividamento entendido como sendo “excessivo”, e;

– Tratamento do montante classificado como excesso, devendo este ser considerado dividendo e assim sendo, existindo a possibilidade de ser sujeito à tributação na fonte quando for o caso.

As posturas mais comuns relacionadas a tal regra são as seguintes:

-“Arm´s lenght”- trata-se de testes com o propósito de verificar a condição de subcapitalização de uma determinada pessoa jurídica, e;

-“Fixed debt equity ratio”- trata-se de uma definição de relação mínima admitida entre dívida e capital.

Acerca da postura denominada”Arm´s lenght”ensina com muita propriedade o Professor Alberto Xavier:

“A Lei nº 9.430/96 parte do princípio de que, nas situações a que se aplica, o preço relevante para efeitos tributários não é o preço real e efetivo estipulado pelas partes, mas um preço hipotético que visa a atender interesses outros, das partes e que não teria sido pactuado caso entre elas não existissem relações especiais resultantes ou de laços de vinculação ou da localização em certos territórios ou a utilização de certos regimes tributários privilegiados.”
(…)
“Embora desempenhando um diverso papel, o princípio at arm´s lenght encontra-se também na essência da disciplina dos preços de transferência introduzida pela Lei nº 9.430/96, tanto que a aplicação das suas normas tem como ponto de partida a divergência entre a médias dos preços praticados no mercado e aqueles praticados nas operações com pessoas vinculadas. É ainda o princípio at arm´s lenght o que está na raiz dos métodos adotados para o arbitramento dos preços.”(01)

Ademais, pode-se entender como sendo “Fixed debt equity ratio” um índice específico de alavancagem, que compara o total do passivo de uma empresa para seu patrimônio líquido total, que também é conhecido como “Multiplicador do Capital Próprio e de Terceiros” ou pela sigla MKPT. Esta é uma medida da quantidade de fornecedores, credores e devedores assumiram o compromisso da empresa versus o que os acionistas tenham cometido.

A regra geral utilizada no Brasil para a dedutibilidade intragrupo encontrava-se delimitada noartigo 299 do Decreto nº 3000, de 26 de março de 1999(RIR), abaixo transcrito:
“Art. 299. São operacionais as despesas não computadas nos custos, necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47).
§ 1º São necessárias as despesas pagas ou incorridas para a realização das transações ou operações exigidas pela atividade da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, § 1º).
§ 2º As despesas operacionais admitidas são as usuais ou normais no tipo de transações, operações ou atividades da empresa (Lei nº 4.506, de 1964, art. 47, § 2º).
§ 3º O disposto neste artigo aplica-se também às gratificações pagas aos empregados, seja qual for a designação que tiverem.”

Assim, é possível verificar que somente pode ser dedutível a despesa necessária à atividade empresarial.

Ademais, até 2009, o limite de dedutibilidade nos casos de juros incorridos em empréstimos contraídos com partes vinculadas, seguida as regras de preços de transferência, quais eram:

– Em relação às operações sujeitas a registro no Banco Centra do Brasil, deveria se ter como foco a taxa registrada, e;

– No tocante às operações não sujeitas ao registro no Banco Centra do Brasil, deveria se ter como parâmetro a base da taxa Libor, para depósitos em dólares nos EUA pelo prazo de 06 (seis) meses, acrescida de 3% anuais a título de spread, proporcionalizados em função do período a que se referirem os juros.

Sendo que em 15 de dezembro de 2009 veio à tona a Medida Provisória nº 472, que em seguida, mais precisamente em 11 de junho de 2010 fora convertida naLei nº 12.249/10, trazendo em seusartigos 24e25novas regras de subcapitalização em relação à dedutibilidade dos juros considerados dentro do mesmo grupo econômico, quais sejam:

– Norma antielisão específica contra endividamento excessivo pela criação de relações máximas de dívidas e capital, segundo oartigo 24, e;

– Criação do requisito da necessidade das despesas e, além disso, a manutenção dos limites das regras de preços de transferência, segundo o artigo 25 caput.

Importante que reste em entendido o conceito de pessoas jurídicas vinculadas, pois tal termo encontra-se indicado nosartigos 24e25acima citados, tal definição consta noartigo 23 da Lei nº 9.430/1996, em todos os seus incisos, abaixo transcritos:

“Art. 23. Para efeito dos arts. 18 a 22, será considerada vinculada à pessoa jurídica domiciliada no Brasil:
I – a matriz desta, quando domiciliada no exterior;
II – a sua filial ou sucursal, domiciliada no exterior;
III – a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, cuja participação societária no seu capital social a caracterize como sua controladora ou coligada, na forma definida nos §§ 1º e 2º do art. 243 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976;
IV – a pessoa jurídica domiciliada no exterior que seja caracterizada como sua controlada ou coligada, na forma definida nos §§ 1º e 2º do art. 243 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976;
V- a pessoa jurídica domiciliada no exterior, quando esta e a empresa domiciliada no Brasil estiverem sob controle societário ou administrativo comum ou quando pelo menos dez por cento do capital social de cada uma pertencer a uma mesma pessoa física ou jurídica;
VI – a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, que, em conjunto com a pessoa jurídica domiciliada no Brasil, tiver participação societária no capital social de uma terceira pessoa jurídica, cuja soma as caracterizem como controladoras ou coligadas desta, na forma definida nos §§ 1º e 2º do art. 243 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976;
VII – a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, que seja sua associada, na forma de consórcio ou condomínio, conforme definido na legislação brasileira, em qualquer empreendimento;
VIII – a pessoa física residente no exterior que for parente ou afim até o terceiro grau, cônjuge ou companheiro de qualquer de seus diretores ou de seu sócio ou acionista controlador em participação direta ou indireta;
IX – a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, que goze de exclusividade, como seu agente, distribuidor ou concessionário, para a compra e venda de bens, serviços ou direitos;
X – a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, em relação à qual a pessoa jurídica domiciliada no Brasil goze de exclusividade, como agente, distribuidora ou concessionária, para a compra e venda de bens, serviços ou direitos.”

Ademais, em relação aos países/dependências com tributação favorecida e os regimes fiscais privilegiados, atualmente encontra-se em vigor um rol taxativo, apesar das discussões acerca da natureza deste, constante naInstrução Normativa nº 1.037/10(IN RFB 1.037), com as alterações supervenientes (02).

Diante deste cenário, a Receita Federal do Brasil, através daInstrução Normativa nº 1.154, de 12 de maio de 2011, regulamentou a matéria, determinando os requisitos constantes em seuartigo 2º, incisos I, II e III. Seguem abaixo os limites impostos pela RFB:

– no caso de endividamento com pessoa jurídica vinculada no exterior que tenha participação societária na pessoa jurídica residente no Brasil, o valor do endividamento com a pessoa vinculada no exterior, verificado por ocasião da apropriação dos juros, não seja superior a 02 (duas) vezes o valor da participação da vinculada no patrimônio líquido da pessoa jurídica residente no Brasil;

– no caso de endividamento com pessoa jurídica vinculada no exterior que não tenha participação societária na pessoa jurídica residente no Brasil, o valor do endividamento com a pessoa vinculada no exterior, verificado por ocasião da apropriação dos juros, não seja superior a 02 (duas) vezes o valor do patrimônio líquido da pessoa jurídica residente no Brasil, e;

– em qualquer dos casos previstos acima, o valor do somatório dos endividamentos com pessoas vinculadas no exterior, verificado por ocasião da apropriação dos juros, não seja superior a 02 (duas) vezes o valor do somatório das participações de todas as vinculadas no patrimônio líquido da pessoa jurídica residente no Brasil.

Sendo que para a RFB é indiferente a forma e prazos de financiamentos obtidos, não sendo relevante os seus registros no Banco Central do Brasil.

A Instrução Normativa em comento também determinou a parcela indedutível de juros, em função dos limites de endividamento previstos na legislação de subcapitalização da seguinte maneira:

X = Y – {(Z/H) x W}

Onde:

X = Parcela de juros indedutíveis.

Y = Total de juros incorridos em operações sujeitas à subcapitalização.

Z = Limite individual ou coletivo aplicável.

H = Média ponderada mensal de endividamento.

W = Total de juros incorridos em operações sujeitas à subcapitaização.

Por fim, importante citar que os juros indedutíveis devem ser adicionados ao lucro tributável pelo IRPJ e CSLL ao final do período de apuração desses tributos (anual ou trimestral), assim como no caso de levantamento de balancetes de suspensão e redução.

Assim, resta posta uma visão geral da matéria, com o intuito de demonstrar as atualidades e sua evolução no tempo.

Notas

(01) XAVIER, Alberto. Direito Tributário Internacional no Brasil. Forense: Rio de Janeiro. 7º ed. p. 296.

(02) A inclusão da Suíça na lista de países constante no art. 1º da referida norma.

Fábio Messiano Pellegrini

Advogado. Coordenador Tributário do escritório Pereira de Carvalho e Monteiro Galvão Advogados.

Fonte: FISCOSOFT

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