Mais da metade dos contribuintes brasileiros já paga Imposto de renda (IR) para a Receita Federal.
Levantamento inédito da consultoria Ernst & Young Terco feito para O GLOBO, com base nos dados mais recentes do Fisco, mostra que 50,3% das pessoas que declararam IR tiveram que pagar imposto ao governo ao fim da declaração em 2011, em vez de terem isenção ou receberem restituição. Isso equivale a mais de 12 milhões de brasileiros, que começam a acertar as contas com o Leão na próxima sexta-feira, 1º de março.
Uma década atrás, essa relação era de apenas 36,2%, ou 5,5 milhões de pessoas. Por trás do movimento está o aumento da renda dos brasileiros e o crescimento da formalização do mercado de trabalho. Segundo o levantamento, o rendimento tributável dos brasileiros (salários, aposentadoria e aluguéis, por exemplo) chegou ao marco histórico de R$ 1 trilhão no ano passado, e pode escalar para R$ 1,1 trilhão em 2013. Também influenciaram a maior capacidade de fiscalização da Receita e a falta de atualização da tabela do IR em relação à inflação. Entre 2002 e 2011, essa defasagem foi de 14,33%, segundo cálculos do Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional).
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— Um terço das pessoas que declararam em 2002 precisava recolher mais imposto. Agora, mesmo após as deduções permitida de despesas com saúde, educação e dependentes, metade precisa pagar mais impostos. Nos últimos anos, foi um crescimento constante — diz Carlos Martins, sócio da área de Human Capital da Ernst & Young Terco. — O lado positivo disso é que mais pessoas estão contribuindo com impostos porque a renda da população cresceu.
Com o crescimento do número de brasileiros que pagam IR, também aumentou a quantidade de contribuintes que optam por preencher a declaração pelo modelo completo, que permite abater gastos com saúde, educação e dependentes. Segundo a pesquisa da Ernst & Young Terco, que teve como base dados divulgados pela Receita em setembro do ano passado, 10,3 milhões de brasileiros usaram o formulário completo na declaração de 2011 (ano-base 2010), 43% do total. Em 2002, somente 34% optavam pelo modelo.
— Mais brasileiros conseguiram acessar planos de saúde e educação particular nos últimos anos, com efeito do aumento da renda. É natural que eles procurem esse Desconto — afirma Leandro Souza, gerente sênior da área de Impostos da Ernst & Young Terco.
Especialista critica Desconto baixo
Para o diretor tributário da Confirp Consultoria Contábil, Welinton Mota, o problema é que as opções de Desconto de gastos na declaração continuam limitadas, principalmente em educação (creche, escolas, faculdades) e com dependentes. Nas despesas com educação, o limite é de R$ 3.091,35. É possível deduzir até R$ 1.974,72 por dependente. Na saúde, não existe um limite.
— O gasto de um MBA pode superar R$ 15 mil por ano, mas o limite de abatimento de gastos com a educação está em R$ 3.091,35 — explica o especialista. — Se compararmos a outros países, as despesas que abatemos aqui são poucas. Nossa alíquota de imposto é até mais baixa do que em países da Europa, mas lá essa contribuição ainda se converte de forma nítida em saúde e educação públicas, mesmo na crise.
O administrador Pedro Schneider, morador de Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio, reclama das limitações para deduzir em sua declaração os gastos com o escola da filha Raquel, de 3 anos. Segundo ele, uma mensalidade supera o limite da dedução de um ano.
— Pago colégio duas vezes: o particular e o público, que sai do meu imposto. A qualidade do serviço público, como educação, não me permite tirar minha filha de um colégio particular — explica Schneider, que também tem a mãe como dependente, e os gastos com plano de saúde dela superam, em muito, o máximo permitido pela Receita.
Além da baixa possibilidade de dedução, o temor de cair na malha fina faz brasileiros optarem por pagar mais impostos do que deveriam. É o caso do médico Cláudio Rafael Lemos. Como outros da profissão, ele acredita que a Receita tem sido dura com profissionais liberais. No ano passado, cerca de 617 mil declarações ficaram retidas na malha fina, segundo a Receita, envolvendo profissionais de diferentes áreas.
‘Gastos cada vez mais inflados’
Apesar de o governo ter conseguido aumentar o volume da arrecadação nos últimos anos, especialistas questionam se a capacidade dos brasileiros de pagar tributos não se aproxima ou passou dos limites. Nos últimos anos, o governo até adotou medidas para tentar amenizar a tributação, como as alíquotas intermediárias do IR. Para Abel Amaro, sócio responsável pela área tributária do Veirano Advogados, no entanto, há claramente um excesso.
— O governo não reconhece se quer crescimento da Inflação real no reajuste da tabela do Imposto de Renda. É um artificialismo que é conveniente para a arrecadação. Essa cobrança para que a máquina fique à disposição do Tesouro e Orçamento, com gastos cada vez mais inflados, cria uma pressão em outra ponta — avalia o especialista.
Segundo Letícia do Amaral, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), o governo perde uma boa oportunidade para reduzir impostos e permitir que a renda dos brasileiros circule pela economia, o que contribuiria para o consumo e o crescimento da atividade econômica.
— Reduzir impostos não afetaria necessariamente a arrecadação do governo. Tributar mais não é a única forma de aumentar a arrecadação, o que também pode ser feito deixando que o dinheiro circule. Isso aumentaria a arrecadação de outros tributos, como PIS/Cofins. Mas ele prefere abocanhar o dinheiro diretamente — afirma.
Fonte: O Globo